Wednesday, May 28, 2014

Changing gears

Just realized there's a higher purpose for these writings of mine. Therefore I'll switch to English because it will make it more likely to get the answers I want. Little by little I'll tell my story (again, because it's already there in Portuguese). But most importantly, I wanna test some hypotheses. My life will serve as a case study, and I wanna find out the components that make up the largest issues I face in life on a daily basis, and see whether they are personal or general given life conditions. 

More specifically, I wanna determine cause and consequence relationships, so that I can find the truth about my real possibilities, given the circumstances I'm in. In doing so I hope to make more informed decisions to build a future closer to what I really want and get less disappointed at the results. Ideally I wanna hear from people in similar conditions I have. That basically mean, someone with a disability, but yet highly functional. 

Someone that has gone through 20 years of rehabilitation (physical), that became indeed highly functional, but that has been inflicted with several open wounds in the process. Someone that has always blended in the non disable world, but have found difficulties that went against his/her very self beliefs, especially concerning 100% preserved cognitive function issue. To be continued....

Monday, May 26, 2014

Meias verdades, meias mentiras, meias soluções, meias vidas

Tenho a impressão de ser a tal da mosca branca ao buscar uma identidade que não deixe nenhuma parte do que sou pelo caminho. Em toda a minha vida, nunca convivi com pessoas com a mesma deficiência que eu fora do ambiente da clínica de fisioterapia onde fiz tratamento por quase vinte anos. Também lá não me lembro de muita gente que tivesse um estilo de vida parecido. Também na época eu não estava procurando. 

Minha ideia era muito parecida à que hoje encontro nos esforços de adaptação no mercado de trabalho: aprenda o que precisa para coabitar o mundo tal como é e fuja das complicações do mundo dos que jamais conseguirão.

Mas essa falta de contato com outras pessoas parecidas comigo gerou efeitos que só agora começo a entender mais a fundo. É fato que a comparação com os semelhantes pode oferecer referência para se ser uma pessoa melhor, e caminhar rumo aos próprios objetivos.

As empresas usam isso o tempo todo, no intuito de estimular o esforço dos funcionários e premiar os melhores desempenhos sob sua ótica. A soma destas partes individuais buscando seus interesses individuais beneficia a empresa, que em si alcança objetivos de outra magnitude. Mas no meu caso, no cotidiano, essa comparação sempre era bastante desvantajosa, principalmente na adolescência. Porque ali contava a beleza física, o charme e a atração recém descoberta.

Eu tinha uma clareza teórica obsessiva da minha igualdade em relação aos demais na escola (fruto não de uma digestão da condição humana e da conclusão de que no fim das contas somos todos seres humanos falhos, etc e etc, mas de uma negação quase esquizofrênica). Os sinais que vinham do ambiente diziam o contrario. 

O resultado disso, foi uma desconstrução de quem eu era. Mas nada foi colocado no lugar. Acima de tudo nesta época, você é o que os outros acham que você é. E claramente eu era pior aos olhos deles e principalmente delas. 

Essa desconstrução gerou um peso próximo do insuportável. Basicamente, porque até ali eu havia pensado que meu intelecto me salvaria da exclusão e do fracasso em geral reservados às pessoas com que de fato poderia me identificar sem grandes ressalvas materiais. Afinal de contas, minha inteligência era normal, até um pouco avantajada, de maneira que não pensava realmente que o futuro fosse ser um problema, já que não precisaria ganhar o sustento carregando caixas ou algo que fosse essencialmente físico. 

E aqui eu quero abordar um assunto que acho nunca discuti abertamente. Um assunto que coloca abaixo a teoria pela qual eu sempre me vendi aos outros como alguém normal com uma face exterior diferente e (consenso geral) pior do que o das pessoas ditas normais. O que acontece é que por mais que minha cognição vá bem, obrigado, existem dezenas, ou centenas (de fato não contei) de fatores que fazem com que mesmo nessas dimensões teoricamente imaculadas da minha existência, haja desvantagens.

Sim, eu passei na USP duas vezes entre os 20 primeiros lugares (talvez porque mesmo sem ter coragem de prestar o curso que eu queria, porque tinha certeza que no âmbito médico minha construção de sujeito pseudo-normal cairia rapidinho) eu me preparei para isso. Por uma razão relativamente simples e mecânica que eu sempre quis ignorar. Não tendo uma deficiência impossibilitante, minha vida foi vivida até hoje na tentativa desesperada de me adaptar. 

Meu carro não é adaptado (isso não me ajudaria), meu local de trabalho também não. Não porque não haja necessidades diferentes a contemplar. Mas porque essas necessidades não são bem definidas, variam conforme o dia e talvez por causa disso não tenham soluções eficazes. O resultado desta interação com o ambiente é uma desvantagem difusa e muitas vezes invisível. E percebo que tenho papel ativo nesta percepção, já que para mim é nítido que essas desvantagens abertas desde o início (ainda que eu soubesse definí-las) me tornariam ainda menos atraente para o mercado de trabalho voltado ao desempenho e me aproximaria da massa de deficientes excluídos do jogo da vida que eu quero jogar e de preferência ganhar de vez em quando.

Então, neste emprego atual, como em todas as atividades da minha vida, a minha adaptação ao ambiente normal está sempre presente, exigindo gasto alto mas variável de energia e ocultando a verdadeira causa da desvantagem. Porque ao mesmo tempo, reconhecer uma limitação que não seja de cunho exclusivamente físico, significa admitir que a parte mais nobre do meu "eu" também foi afetada por todo este processo. E sendo assim, me obrigaria a aceitar uma vida ainda mais reduzida em experiência e produção e isso seria um golpe duro e duplo. Significaria que além da dimensão física e dos seus desdobramentos mais diretos e os afetivos resultantes, há também que se esperar os desdobramentos relacionados à esfera sagrada da cognição, espaço em que jamais esperei ter de fazer concessões à deficiência, por ser eminentemente física, ainda que central. 

De maneira que assim criei minhas armadilhas em que continuo caindo regularmente. Tenho metas altas de mais, por não identificar claramente meus limites e não poder reconhecer abertamente minhas desvantagens. Tento então ignorá-las, já que a ruminação dessas questões não é produtiva porque não traz ação eficaz e não é nada sexy. O que então o mundo externo gentilmente faz questão de destroçar como ilusão, ainda que não de forma clara e objetiva. Afinal de contas sou bem inteligente, e culto, e capaz e educado. Mas o fato concreto e duro como o concreto, é que a desvantagem existe e que ela não pode ser mitigada concretamente. Assim se explica a angústia, a insatisfação e a frustração. A sensação de estar quase lá e a falta de fôlego para a última milha. A necessidade do reconhecimento externo como forma de ter um pouco mais de segurança de que o esforço vai levar a algum lugar e o descontentamento com os resultados sempre aquém dos necessários para exorcizar o fantasma da invalidez, do destino imutável, sina.

Se o título do texto fala de meias verdades e meias mentiras, a verdade inteira é que ainda hoje, infelizmente, um cara como eu ainda não goza dos meios externos para se realizar plenamente como uma pessoa sem deficiência em condições semelhantes de temperatura e pressão. E por mais que eu me culpe por isso o tempo todo, e pense trocentas vezes por hora no que eu posso fazer para contornar essa situação que me revolta, talvez o primeiro passo seja reconhecer esta verdade inteira e a partir dela talvez criar uma alternativa realmente válida e não mais uma experiência de exclusão, desgaste e exaustão. 

Está claro, não sou igual a todo mundo, muito menos às pessoas que estudaram comigo em instituições de elite. Talvez a culpa não seja mesmo minha, a não ser de fugir dessa conclusão como o diabo da cruz. Talvez então venha o descanso dos justos, porque ainda que minhas metas estejam todas longe, pelo menos paro com a grande sacanagem inconsciente que fiz comigo desde sempre.

Monday, May 19, 2014

Verdade ou desafio?

Acho que a maioria das pessoas conhece esse jogo adolescente em que as pessoas se obrigam mutuamente a enfrentar um desafio. Sei que a origem dessa brincadeira é gringa porque volta e meia ela aparece em um filme ou seriado americano. O fato é que de qualquer jeito o que vem pela frente é um desafio: seja fazendo algo ousado, difícil ou contando algo embaraçoso e verdadeiro sobre si próprio. E talvez para tornar a tarefa menos dolorosa, é comum ter uma bebida alcóolica envolvida na brincadeira.

Resolvi retomá-la depois de perceber que na minha vida essa dinâmica se repetiu e ainda se repete muitas e muitas vezes. Quando eu era pequeno, de alguma forma consegui extrair do mundo que me rodeava a ideia de que não havia nada de errado comigo. Isso pode ser algo bastante reconfortante em relação à construção da identidade de alguém com uma deficiência, porque traz consigo toda a esperança de poder escapar às estatísticas e ter uma vida boa, como a de quase todos aqueles amigos de escola que de fato não tinham visivelmente nada de errado (pelo menos não uma deficiência física).

A receita para isso é simples, mas requer um nível altíssimo de teimosia irracional: primeiro você apaga da sua vida todos os pontos que corroboram com a existência da sua deficiência. Você simplesmente exclui esses momentos da sua auto-imagem. Além disso, você seleciona todas as situações de convívio social com seus amiguinhos de escola sem deficiência em que suas diferenças ficam nítidas (aulas de educação física ou brincadeiras que exijam um desempenho físico mais extremo) e também despreza a importância delas.

O problema é que aí vem a adolescência, e aí seu auto-conceito é posto à prova dos outros. Até ali, você pode conseguir fazer quase tudo o que quiser, basicamente porque você determina o que quer e até onde vai pra conseguir. Quando não consegue pode se dar uma desculpa e dizer que na verdade não queria aquilo mesmo. Mas quando os hormônios começam a tomar conta do caboclo, ele começa a querer coisas que dependem em grande parte dos outros (ou das outras). Essa hora separa os homens dos meninos, literalmente.

Até então, a diferença prática entre alguém que se aceitasse muito bem com deficiência e uma pessoa que não aceitasse nada em relação a essa condição de desvantagem era nula. Na verdade, é possível dizer que aquele que nega sua natureza tenha mais incentivos para superá-la do que uma pessoa que esteja em paz com o que realmente é. Porque essa pessoa em negação vai às últimas consequências pra manter seu castelo de cartas de pé. Mas acontece que o castelo é mesmo de cartas, e agora o negador depende de ninguém soprá-lo para manter sua ilusão.

Mas é claro que lá fora venta bastante, especialmente em se tratando de meninas adolescentes e lindas com cabelos esvoaçantes. Claramente o castelo vem abaixo! Várias e várias vezes! Então você pergunta: mas que diabos tem isso a ver com verdade ou desafio? Bom, acho que tenho jogado isso comigo mesmo desde que me conheço por gente. Só que sendo muito cabeça dura, eu sistematicamente optei pelo desafio e me meti a fazer aquilo que a verdade teoricamente não permitiria. Assim, o desafio sempre foi a minha maneira maluca de derrotar a verdade.

Porém, a verdade não se cansa mas eu sim, depois de tanto desafio. E como na adolescência, há muitos outros momentos na vida em que precisamos da verdade, até para escolhermos os desafios que vamos querer enfrentar até o fim. Por isso, neste momento eu peço uma trégua à verdade e reconheço o quanto a evitei e combati. Mas agora já não sou menino, e preciso dela pra me guiar. Portanto rogo à verdade que me perdoe por tanto desafio e que ilumine minha estrada. Que por mais que a verdade doa, aceitá-la é ao fim e ao cabo o maior dos desafios.

Saturday, May 17, 2014

onde mora a deficiência? (Medical concept in crisis)

Às vezes me sinto totalmente isolado com essa deficiência. Ela tem características intrigantes. Me afastou do main stream da normalidade saudável em termos de identidade, ainda que em termos práticos não tivesse que ter tomado grandes coisas da minha vida. Isso é um mistério pra mim. Afinal de contas, minha deficiência não passa de estética.

Mesmo assim, quando penso na minha vida e em meus objetivos, não encontro nenhum que não tenha sido negativamente afetado por esta condição. Num dia de revolta contra essa desvantagem indissociável, fiz uma busca no Google (meu empregador, um capítulo a parte) sobre o ódio à deficiência.

O que eu esperava encontrar eram histórias de como as pessoas superaram esta dor crônica e foram em frente com suas vidas de maneira mais ou menos satisfatória. Sem aquela babaquice de deficiente super-herói que me dá vontade de vomitar.

Na verdade os primeiros 20 resultados da busca não tinham absolutamente nada a ver com o que eu procurava. Falavam de crimes de ódio contra deficientes, o que acabou me dando ainda mais raiva da coisa toda. O fato é que eu odeio a minha deficiência e tudo que resulta dela. Acho que ao crescer criei expectativas de vida erradas que foram frustradas seguidamente, principalmente ao virar adulto. Nesse sentido acho que me sinto um pouco como as pessoas que fazem mudança de sexo. Me sinto um sujeito normal dentro de um corpo que não me serve. Mas ao contrário das primeiras, não há muito mais que eu possa fazer para mudar as coisas concretamente.

Um dos únicos artigos que encontrei sobre o que eu realmente procurava, foi o de uma moça que tem osteogênese imperfecta (que aliás é um nome lindo para uma condição revoltante). Ela tem algo de cristão progressista e eu não esperava nada de mais do texto. Mas a tese era curiosa. Pra ela é possível odiar a deficiência sem odiar a própria vida. E ela dá exemplos analógicos bons, como o fato de que todos os pais desejam ardentemente que seus filhos não tenham uma deficiência, mesmo amando muito os filhos que efetivamente nasçam com algum comprometimento. Outros argumentos não fazem muito sentido pra mim por terem uma fundamentação mais teológica (é ou não é de Deus, o que realmente pra mim não se aplica grandes coisas).

Ultimamente andei flertando com a teoria da imposição social da deficiência. Em última análise, a deficiência seria criada pela maneira pela qual a sociedade trata determinadas pessoas, e não por suas características de quadro clínico. Consigo ver bastante sentido nessa teoria. Mas não deixar de sentir ódio, seja da sociedade, seja da condição física, seja da minha incapacidade de engoli-la com ou sem farinha.

 Não consigo deixar de pensar que cada tratamento indigno, cada complacência exagerada, cada julgamento de percepção infundado têm uma grande parcela de contribuição desta lesão no cérebro que eu sempre tive mas nunca vi. Então aqui está minha contribuição para a busca do Google sobre o ódio à deficiência (apesar de também não ter a parte em que a pessoa supera isso e vive em paz).